Hoje nos acostumamos a ouvir sobre a geração nem nem - jovens que nem estudam e nem trabalham. Uma tragédia para eles próprios, para sua família e para o país.
Descobri que, aos 56 anos, também faço parte de uma geração que também pode ser chamada de nem nem. Resultado do fato de que nós, seres humanos, estamos vivendo bem mais que os nossos antepassados. Essas dúvidas ele nem tiveram.
Percebi pela primeira vez no metrô. Algumas pessoas me observando ostensivamente, na tentativa de decidir se sou ou não idosa, se me oferecem ou não um assento. Se estou de cabelo solto, de cachinhos, a dúvida inexiste ou, quando ocorre, se resolve logo e eu sigo de pé. Mas quando estou de cabelos presos, com as raízes brancas à mostra, a dúvida sempre se põe e é mais comum que me ofereçam seus lugares. Depois, ao entrar num laboratório, já na porta, uma moça me pergunta o procedimento e me indica uma cadeira. Sou atendida prontamente: uma funcionária colhe meus dados e, apenas quando me indica uma cadeira para aguardar até ser chamada para a retirada de sangue, vejo muitas pessoas aguardando o atendimento que acabei de ter e, algumas, com olhares de insatisfação e de reprovação, a me dizerem que furei a fila.
Assim, nem sou velha nem sou nova.
Minha netinha resolveu o problema, com sua lógica bastante coerente. De tanto ela me pedir para ir da sala pra cozinha buscar água, pipoca, seus bichinhos de pelúcia, sandália etc. eu reclamei:
— Letícia, eu não aguento esse ir e vir. Eu sou velha! E ela:
— Vovó, você não é velha. Você nem tem rachaduras no rosto. E nem tem cabelo branco!!! Retruquei:
— Tenho sim. Olha aqui. É que você não percebeu. E mostrei meus pés de galinha, minhas pálpebras flácidas já se arrastando pelo chão e meu bigode chinês. E puxei os cabelos para trás pra ela ver a mecha branca bem no centro da cabeça.
Ela insistiu:
— Vovó, velho tem todo o cabelo branco!
Mas no dia em que a minha filha me chamou para conhecer uma amiga da minha idade, inclusive nascida no mesmo mês, minhas poucas certezas se esfacelaram. Ao vê-la, tive vontade de me sentar na calçada e de tomar umas cachaças - que eu nem costumo tomar - tal o meu desencanto. Eu parecia a avó da amiga.
Jesus!
Nosso corpo é um mapa da nossa existência. Traz nele as marcas das experiências que vivemos, para o bem e para o mal. Assim, com certeza, haverá uma mulher de 56 anos que pareça mais velha que eu.
Eu também fico em dúvida. No metrô e em outros ambientes públicos, fico olhando a pessoa, avaliando o seu grau de envelhecimento, comparando-a a mim para descobrir qual de nós tem mais direito de se sentar. E já me aconteceu várias vezes de, ao oferecer o lugar, ouvir uma frase carregada de um certo espanto e reprovação: __ Não! Obrigada! É como se me dissessem: Tá me achando velha/velho é? Pois você é mais velha que eu!
Então, mais que a aparência, parece que velhice é estado de espírito. Hoje, um dia depois de completar 56 estou jovem, jovem... praticamente uma menina!