quinta-feira, 13 de julho de 2017

Tô rica! Tô rica! Tô rica!

     As estatísticas nem sempre são confiáveis. Numa delas, fala-se que apenas dezesseis por cento da população brasileira tem conseguido chegar à universidade. Mesmo que essa porcentagem esteja equivocada e que sejam mais pessoas a chegarem lá, ter concluído um curso universitário no Brasil ainda é um privilégio. Não deveria ser,  mas é.
     Para nós, pais professores, isso era imperativo. Nossa missão sempre foi levar nossos três filhos à conclusão de um curso superior.
     Que jornada!
     Nos primeiros anos, trabalhávamos numa escola particular que dava bolsas aos filhos dos  professores.
     Depois, com mudanças na instituição, passou a ser uma meia bolsa.
     E chegou o dia em que já não podíamos manter nossos filhos lá. 
     Esquisito,  não é? Dois professores que não conseguem dar educação formal de qualidade aos seus filhos.
     Naquela época, a escola pública estava em péssimas condições, diferentemente de hoje que, apesar de ainda enfrentar dificuldades,  tem verba garantida no orçamento,  tem pais da classe média que se viram forçados, com o desemprego, a levarem seus filhos e,  com isso, iniciaram um movimento de revalorização, participando de ações efetivas de empoderamento e reivindicando melhorias para a mesma.
     No nosso caso, tivemos a sorte de encontrar outra escola acolhedora, cuja proprietária é uma professora, amiga, e que nos deu condições de continuar a educar nossos filhos da forma que acreditávamos ser a melhor. E depois outra tão acolhedora quanto.
     Mas não são só as mensalidades o problema da formação. É um pacote: roupas, transporte, alimentação, material escolar, os eventos,  os presentes de aniversário dos amigos etc.
     Eu me lembro do meu espanto ao constatar que, quando os pés de um cresciam, os pés dos outros dois cresciam também. Jesus!
     Então veio a faculdade. Muita reza para que eles quisessem cursar cursos oferecidos pela universidade federal.
     Não foi bem assim. Seus desejos, suas inclinações eram para cursos que a federal não oferecia ou oferecia no interior.
     Deste modo, foram: um semestre de Letras/ inglês, cinco semestres de Engenharia Elétrica e um curso completo de História na federal. E três cursos completos na instituição particular: Direito, Jornalismo e Arquitetura.
     Os livros do Direito não superaram o custo dos procedimentos exigidos na Arquitetura.       Ainda tremerei se ouvir as frases:
__ Mãe, tenho que plotar.
__ Mãe, amanhã vou renderizar.
__ Vou comprar os materiais para a maquete!
     E o famigerado xerox?
     E também tem a vida social e afetiva desses seres em formação.
__ Tem festa na casa de fulano. Me comprometi  a levar carne!
__ Amanhã é aniversário de fulana.  Tenho que comprar o presente.
__ O professor de História está organizando uma excursão.  Vale ponto.  Tenho que ir.
     Eu passaria dias elencando frases como essas, muitas vezes ouvidas com desespero, mas respondidas com uma tentativa de serenidade, na maioria das vezes. Será que eles percebiam?
     E os namoros? Houve um período em que eu brincava dizendo:
__ Meu Deus! Depois de velha, eu ampliei minhas preferências?  Porque compro presentes para namorado e namoradas! E tinha até presente de aniversário para a possível futura sogra. Eram umas queridas, devo registrar. Todas. Mas eu, com as contas latejando na cabeça,  findava questionando:
__ Até a sogra?
     E eu dizia:
__ É,  na hora de beijar na boca, ninguém me chama!
     É ridículo o que vou contar.  Muitas vezes, entre um namoro e outro, me peguei negociando com eles,  orientando :
__ Fica sozinho/sozinha! É  tão bom!  Foca nos estudos! Olha, mas se for começar namoro, lembra que não pode ser perto da data do aniversário dele/dela, nem perto do dia dos namorados!
      Muitos anos de cheque especial,  de empréstimos bancários.
     Meus cartões de débito e de crédito passavam a maior parte do mês longe de mim.  E quando voltavam para a minha carteira, era certeza: sem saldo e sem limite.
     Cansei de ver o balanço anual de um certo banco, me horrorizar com o lucro absurdo que ele anunciava e de pensar com meus botões: Faço parte disso. Contribuí muito!
     O bom é saber que eles, meus filhos, valorizam nosso esforço. Que se sabem privilegiados por terem podido estudar sem trabalhar ou trabalhando em curtos períodos, quando tinham que estagiar ou quando surgiam oportunidades, nunca por obrigação ou necessidade.  Nunca foi: Se eu não trabalhar, eu não estudo!
     Talvez tudo isso faça com que vocês,  meus queridos amigos leitores - sim, porque quem lê os textos que publico neste blog são meus amigos - tentem entender o meu surto no dia em que pagamos o último boleto bancário referente à última mensalidade da última faculdade :
__ Tô rica! Tô rica! Tô rica!
     Hahahah
     Eu sei que não é bem assim. Nós sabemos, o Tito e eu, que ainda contarão com nosso apoio. E nós estaremos a postos.  Não dá para sermos felizes sozinhos. Não seremos felizes podendo ter uma vida melhor com filhos passando apertos.
     Como disse minha irmã ontem no whatsapp :
__ Aprovaram a reforma trabalhista! O que será dos nossos filhos?
     Neste país, o dia da formatura, quase sempre, antecede o primeiro dia de desempregados dos nossos jovens.
     Mas tenho esperanças. E estou feliz!
     E escrevo este texto um dia depois de ter assistido à defesa de TCC do meu caçula.
     Vou levar na mente e no coração a alegria dele e dos outros dois, não só no dia da colação de grau,  mas nos dias de todas as alegrias das suas vidas.
     Ah! Meus cartões de débito e de crédito estão na minha carteira!

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Quem canta é mais feliz!

     Eu adoro cantar.
     Não sei. Mas adoro.
     Quando digo não sei, é que não sei mesmo!
     Só para se ter uma ideia da intensidade desse "não sei", conto uma cena que se repete aqui em casa.
     Eu, na faxina, lavando um banheiro ou pondo uma roupa no varal, cantando. E alguém da casa, em algum momento, vem e pergunta, exclama ou comenta:
__ Mãe, porque você tá chorando? ou
__ Neusa, o que aconteceu?  Porque esse choro?
__  Conversa comigo. Fala que eu te escuto!
     E tudo termina em farra e risos.
     E eu, claro, voltando a cantar. Um melhor: achando que estou voltando a cantar.
     Poderíamos julgar que um pouco disso é má vontade. Mas assumo a parte da incompetência.
     Já tentei aprender.
     Entrei no coral da Unir. No dia em que fui chamada para classificar minha voz, ela, a voz,  sumiu.
     Foi um vexame.
     Mas, mesmo assim, ainda continuei por algum tempo.
     Só que a vida, as aulas, os estudos, a casa, os filhos pequenos... tudo me afastou do coral.
     Agora vou tentar de novo.
     Vi uma foto de um coral nas redes sociais.  Entrei em contato. Aceitam pessoas da comunidade. Primeiro encontro. Fui muito bem recebida. Pena que era o último do semestre. Início do recesso. Retorno no final de julho.
     Mas já senti o gostinho. A pasta de músicas é um oásis. Só músicas bonitas. Perguntei se terei que passar pelo processo de classificação da voz.  Simmmm! Ai, meu Deus!
     Aquecimento vocal. A primeira canção -ABC do sertão, de Luiz Gonzaga. O maestro se aproxima para ouvir melhor minha voz.
     E eu explicito minha angústia:
__Será que ela tem classificação?
     Ele sorri. É,  com certeza, alguém que, como diz a música, tem " fé na vida, fé no homem, fé no que virá..."
     O que sei é que estou muito feliz.
     Ainda nem cantei decentemente. 
     Ainda nem classifiquei minha voz.
     Para falar a verdade, ainda nem acredito que ela tenha ou mereça alguma classificação, mas já estou vibrando com a possibilidade de vir a cantar.
     Se acontecer, claro, vou contar aqui neste blog. Com certeza, minha cantoria merecerá um texto.  Se der agosto, entrar setembro e o assunto não voltar... Aí será o caso de imaginar que continuo lavando o banheiro e ouvindo dos meus amados:
__ Mãe, porque você tá chorando?