sábado, 18 de janeiro de 2020

Sonhos...

Quando eu tinha 16 anos, em 1978, era uma pirralha crua de vida, morando no interior de SP, ouvi Elis Regina cantar "Maria Maria" pela primeira vez.
Nós, as meninas daquela época, cantávamos "Maria Maria" a plenos pulmões, emocionadas, como se fôssemos nós aquela Maria. Assim, me apaixonei pela cantora, pela música, pela letra, pelo autor da letra, Milton Nascimento, e por todas as letras e músicas que ele compôs depois.
Amo esse mineirinho.
Amo inclusive canções que, apesar de belíssimas, não tiveram grande divulgação. Posso citar "Sebastião", feita em homenagem à cidade do Rio de Janeiro - pura poesia, e "Duas sanfonas", que ele gravou cantando junto com a Sandy - um primor.
Pois bem, a vida seguiu seu curso, com tudo o que há de comum e esperado para pessoas que, como eu, nasceram nas classes populares: trabalho, trabalho e trabalho. Depois: estudos, amores, desamores, mais estudos. Casamento, filhos, trabalho estudo. E boletos. Muitos boletos ao longo do tempo e até hoje.
Acalentei o sonho de, quem sabe um dia, poder ir a um show do Milton Nascimento. E esse sonho ficou guardado, junto a tantos outros.
É interessante como os sonhos não envelhecem, como já disse o próprio Milton Nascimento. Escrevendo agora, sinto que meu sonho hoje tem o mesmo frescor do sonho daquela menina que eu fui um dia!
Quais são os seus sonhos? Onde eles estão guardados? Visite-os. Faça-lhes um afago, um carinho. Traga-os de volta à memória. Atualize-os na pessoa que você se tornou.
Quem sabe?
Ontem, dia 17 de janeiro, eu fui assistir ao show do Milton Nascimento, no Espaço das Américas, em São Paulo. É o último show de uma turnê com o Clube da esquina.
Meu presente de Natal. Ganhei da Larissa!
Foi maravilhoso.
Fomos Lucas, Larissa, Tito e eu.
Mas também levei aquela menina de 1978, raquítica, de cabelos desgrenhados, que cantava emocionada.
"Maria Maria" foi a última música. Mas não cantou sozinho. Cantaram juntos: Samuel Rosa, Maria Gadú, Maria Rita, Criolo, Wagner Tiso, Fernando Venturini, Lô Borges... e a plateia apaixonada.
Foi muito melhor que no meu sonho.
E sei que ficarei em estado de graça por algum tempo. Espero que por muito tempo.
Será mais ou menos assim:
__ Mãe, a Ceron cortou a luz!
__ Tudo bem! A gente acende uma vela! Eu fui ao show do Milton!
__ Eita! Queimou o feijão!
__ Tudo bem! Comer sem feijão um dia não mata ninguém! Eu fui ao show do Milton!
__ IPVA, IPTU, tudo tá mais caro!
__ Calma! Vamos parcelando tudo! No fim, vai dar certo! Eu fui ao show do Milton!
Será assim. E não haverá outro jeito, terei que ficar insuportável!!!!!
Seria utópico encerrar esse texto afirmando que os sonhos se realizam. A vida me contradiria. Há milhares de sonhos que não se realizam.
Mas quando um deles se materializa, isso nos enche de esperança e nos possibilita, pelo menos, afirmar:
Há sonhos que se realizam. 

domingo, 12 de janeiro de 2020

Somos todos africanos!

Há alguns dias, em São Paulo, na livraria Cultura, vimos a Monja Coen falar sobre o seu livro "O que aprendi com o silêncio" e, depois, fomos à fila dos autógrafos. A intenção era que ela autografasse um livro pra nós, em nome do Lucas, e um outro com o qual presentearíamos o primo e sobrinho João Ricardo, que está estudando em Cape Town e que encontraríamos em breve.
Na fila, uma das auxiliares já avisou que ela estava cansada e que não estava escrevendo os nomes das pessoas, estava apenas assinando. Lembrei- me de uma outra fila de autógrafos, em Porto Velho, do escritor Ziraldo. Também fomos avisadas, minha amiga Janes e eu, mas pedimos do mesmo jeito.
Pidonas!
E ganhamos dois autógrafos lindos. Eu, para minha neta Letícia. Ele escreveu: Para a Letícia, cheia de alegria. É o significado do nome dela! E para o filho da minha amiga, escreveu: Viva o Benjamim! Poderíamos ser chamadas de caçadoras de autógrafos.
Voltando à fila da monja, quando chegou nossa vez, pedi: É para meu sobrinho! Ele está morando na África do Sul. E ela, muito gentilmente, escreveu: João Ricardo, somos todos africanos!
Viajamos. Embarquei com essa frase na memória.
E tudo o que vivemos nesses dias só confirmou a assertiva. Tantas cores. Tanta festa em nossos corações. Nossos ancestrais, que nos habitam a todos nós, possibilitando-nos a sensação de um reencontro, como se já tivéssemos estado na África. Senti uma nostalgia imensa, como uma saudade de tudo o que não vivi nesta vida, mas que vive em mim, a partir daqueles que me precederam.
A luz de Cape Town, o Kruger, as belezas naturais - como a Table Mountain; as tragédias da segregação racial, materializadas na Robben Island e no Apartheid Museum; a delicadeza desse povo - lindo!; as línguas africanas com as quais tivemos contato: Xhosa (Cosa), Zulu, Tshwana, Sotho, Shangani, dentre as doze línguas oficiais; os maravilhosos cabelos - que se transmutam, na mesma mulher, a cada dia; a música divina que ouvimos... tudo ficará nos nossos corações e nas nossas almas.
Somos todos africanos!
Já sabíamos disso desde sempre.
Só precisávamos atualizar esse saber. Viva todos os povos! Vivam todos! Porque, afinal, somos todos um povo só!