Era
por volta de seis horas da manhã. Manhã de um domingo. Dia 15 de julho de 2012.
Estávamos
exaustos. Vínhamos de uma experiência que, cada vez mais, as pessoas estão
vivenciando na cidade de Porto Velho, que inchou – e não cresceu – após e
durante o advento das usinas: batida no trânsito. Se bem que, naquele caso, nem
foi por causa do aumento da frota e nem da negligência de outros motoristas.
Foi
por causa de negligência sim, mas apenas do meu caçula, recém-motorista, antes
da conscientização de que um carro é uma arma e de que, à noite, deve-se parar
até no sinal verde e dirigir com velocidade máxima de 50 quilômetros por hora
etc. essas informações que nós, pais, repetimos, incansavelmente, e que eles,
os filhos, já nem ouvem mais, e chamam de blá-blá-blá. Enfim, o acidente foi
antes de ele amadurecer como motorista.
Fui
acordada por volta das quatro horas da manhã, pelo mais velho que, esbaforido,
tentava achar os dados da seguradora. Em seguida, e antes que pudesse respirar
e assimilar a notícia, outro telefonema. Desta vez, era uma amiga da minha
filha que, tão esbaforida quanto, me dizia: Tia, estamos indo aí te buscar! O
Lucas está queimado!
Quem
é mãe pode imaginar meu desespero.
Levantei-me,
troquei de roupa e saí reunindo o que eu julgava que seria útil: algodão,
rifocina, soro fisiológico, pomada contra queimadura.
Chegando
lá, vi o Lucas, em pranto, com o braço queimado: o air bag abriu um minuto após
a batida e soltou um ar quente que o atingiu. Além disso, um pequeno hematoma
próximo ao olho e um corte no braço.
Um
amigo, com o nariz sangrando e outra amiga, com as marcas da freada causadas
pelo cinto de segurança.
Depois...bem,
depois o de sempre: contato com seguradora, guincho, espera, justificativas,
explicações e mais espera.
Soube
depois que a galera que lá estava reunida quando eu cheguei – é impressionante
a capacidade que eles têm, em tempos de celular e de internet, para se
comunicarem: é instantâneo, imediato - se preparou para ouvir a bronca que eu
daria.
Como
uma mãe que sabe que o filho sofreu um acidente de trânsito e que está ferido pode
brigar antes de acudir, socorrer, fazer curativo, abraçar, acalmar? Pudemos rir
dias depois, que é o que fazemos todos nós quando os imprevistos que nos
ocorrem não são fatais e podem, com o tempo, ser esquecidos.
Voltemos
agora às seis horas da manhã, horário com o qual iniciamos essa conversa.
À
mesa da cozinha, atordoada, com dúvidas sobre se conseguiria voltar a dormir, pensei
num chá.
Aqueci
a água meio em câmera lenta, escolhi camomila, é claro, e aguardei o tempo
necessário da infusão. O Lucas já no quarto, ressabiado, assustado ainda.
Aí
vi minha linda menina, sentada à mesa também e me vi perguntando-lhe:
__
Você quer chá, filha?
E
ela:
__
Quero, mãe, vou ficar aqui com você e tomamos chá juntas.
Assim
que eu a servi, ouvi sua voz:
__
Huuummmm, delícia! E tomamos juntas e demoradamente o chá, vendo a claridade do
dia vir chegando.
Precisei
de alguns dias para entender o que houve naquele dia: a Larissa detesta chá!
Jamais toma chá!
Só
então constatei o seu gesto generoso e solidário. Não pôde me deixar sozinha na
cozinha, o dia amanhecendo, eu, naquele estado de perplexidade.
Dividindo
o chá comigo, sentiu-se dividindo as minhas dores também.
Em
dias difíceis, esta lembrança me aquieta a alma. Posso me perdoar pelas minhas
limitações, pelas minhas fraquezas.
Se
fui capaz de gerar seres humanos tão delicados – e eu fui – é que houve acertos
na caminhada.
Graças.
Assim,
nesses dias difíceis, me lembro, às vezes, dessa loirinha dizendo:
__
Huuummmm, delícia!
E
rio, feliz!
Como
estou rindo agora.
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