O avião ainda no solo. Mas as portas já fechadas. Cintos afivelados e poltronas na vertical.
Vem a comissária de bordo à frente para iniciar os procedimentos de orientação. Faz todos aqueles movimentos conhecidos, fala aquela frase desagradável sobre assentos flutuantes - bem que poderia pular essa parte! Que mau gosto!
O piloto avisa:
__ Atenção! Portas em automático.
Preparados estamos todos os passageiros para a decolagem.
De repente, o avião apaga. Todinho.
E ouço uma voz de criança à minha frente:
__ Desligou, mãe!? Sem resposta.
E, em seguida, uma voz adulta, masculina e bizarra, às minhas costas:
__ Ainda bem que foi na terra! Já imaginou se estivesse no ar?
Não precisava ter explicitado o que passou pela cabeça de todo mundo, né?!
Todos os passageiros em silêncio.
E o avião se acende num relampejo rápido, mas com tempo suficiente para ouvirmos, de novo, a voz da criança:
__ A energia chegou!?
E se apagou novamente. Ao que o mesmo pequenino exclama:
__ Tá escuro, mãe!
É. Está escuro. Fora e dentro de todos nós, seres amedrontados pelas notícias de acidentes aéreos, que vivenciamos, cotidianamente, a seguinte contradição: por um lado, nos gabamos de termos conseguido a proeza de voar. Um feito para uma espécie bípede e sem asas; por outro lado, o constrangimento de não confiarmos tanto assim nessas máquinas voadoras, a despeito das pesquisas todas que nos contam que o avião é o meio de transporte mais seguro do mundo.
E o avião apagado. E todos nós na escuridão.
E eu, com meu celular no modo avião, registrando os fatos em tempo real. Sim, meus queridos leitores: este texto para este blog.
Para passar o tempo?
Para não ter que pensar?
Nem sei. Só sei que meu dedinho vai rapidamente achando as letras que vão dando sentido a essa história.
E o avião se acende de novo.
Não sem antes o sinistro passageiro atrás de mim soltar mais uma pérola:
__ É. Tá com defeito mesmo!
Deve ser engenheiro ou algo parecido para dar tal veredito contrário a todas as nossas esperanças.
Me lembrei daquela fala daquele político:
__ Porque não te calas?
É o que eu diria, naquela hora, se tivesse voz. Ao homem. Não ao menino.
O menino, inocente.
O homem, sádico.
E o processo se reinicia.
E eu tremo um pouco na decolagem que me parece mais demorada, mais barulhenta, mais tudo de incomum com as decolagens que já vi na minha vida inteira.
Mas o avião sobe. Ah! O milagre de voarmos, nós, humanos tão imperfeitos.
E eu termino meu texto. Respiro leve. Os ombros não mais contraídos.
Posso até voltar a sentir aquela felicidade bobinha sentida agorinha a pouco quando vi encerrarem o embarque e perguntei para a comissária se tinham mesmo embarcado todos os passageiros e ela confirmou.
E ri gostoso.
E comemorei porque estava só eu na minha série de três apertadas poltronas.
Com as pernocas já saltitantes de se saberem esticadinhas pelas próximas três horas.
E por ter a certeza de que, desta vez, eu não desembarcaria com pés inchados e com dor na alma.
Mas não.
Nem me estico toda.
Nem ocupo os espaços livres.
Espaço? Quem precisa de mais espaço?
Fico quietinha no meu canto.
Estamos voando.
Isso é o que importa!
P. S.: Sabe o homem? Roncou a viagem inteira!
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