sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Eternidade


Estou prestes a completar 50 anos e, apesar de estar um pouco assustada e amedrontada com o que virá, pois vivemos num mundo que ainda não sabe tratar bem os idosos, tenho me permitido, já há algum tempo, me maravilhar com as descobertas desta fase da vida.

As principais, que me estimulam muito, são a percepção de que os problemas diminuem de tamanho, com o passar do tempo; e a constatação, perplexa e com uma certa alegria, de que este não é um tempo só de perdas.

Que tranquilidade me dá quando me deparo com uma dificuldade e não sinto mais tão fortemente aquele frio na espinha, e não passo tantas noites em claro, e não perco imediatamente a paciência nem o humor e me acalmo com a certeza de que, seja o que for, vai passar.

Neste semestre, perdi um parente querido e meu filho sobreviveu a um acidente de carro terrível. Enfrentei estas situações, com as marcas que elas nos deixam, é claro, mas com sabedoria e equilíbrio. Em paz.

É a temperança que chega, devagarinho, se instalando em mim. Essa virtude - tão necessária neste momento em que as relações são tão instantâneas, em que se valoriza o prazer imediato, em que a ode da moda é a felicidade a todo custo, mesmo que seja à custa da infelicidade de outros - é um presente do tempo.

Bom aceitar as rugas e os limites do corpo, cuidando dele, mas sem o afã da beleza ilusória e a alto preço. Doeu ver as bolsas de gordura e de pele se formarem sob minhas pálpebras e ainda dói ver meu corpo ganhar uma forma estranha, não vou negar. Além disso, as letras diminuíram consideravelmente de tamanho e a minha memória me trai quando mais preciso dela. Mas tudo isso é já parte de mim, me constitui.

Bom ter mais tempo e mais espaço para ouvir os outros. Este, mais um presente que a idade nos dá: ouvimos mais e melhor, ouvimos com o corpo e com a alma.

No livro “Vidas a retalho”, apresentei, como uma das razões pelas quais escrevo, a minha crença em que permaneceremos vivos, através da escrita, de que nos perpetuaremos nos que virão, nas pessoas que já amamos, mesmo sem conhecê-las, nas pessoas, mesmo, que nunca conheceremos: os filhos dos filhos dos nosso filhos.

Era uma ideia, um desejo, uma fé.

Agora é verdade.

Vou ser avó. E a imagem que hipotetizei anos a fio e que foi culturalmente construída em mim, em todas nós: a de uma mulher vencida pelo cansaço das batalhas da vida, sem brilho, sem gás, sem projetos; e a imagem estereotipada - coquinho na cabeça, grisalha, xale nas costas, tricô e cadeira de balanço - simplesmente se foi, evaporou-se.

É exatamente o oposto.

Sou tomada por um sentimento de plenitude, de vida que se renova, de recomeço. Amo mais e amo melhor.

Me vejo com este novo ser nos braços e me sinto eterna. Nele, meu filho renasce e eu também.

Eu gosto de gente.

Não me engano. Sei que não há limites para a maldade humana, mas também sei que não há limites para a bondade humana. E me alegro com os exemplos que vejo, todos os dias, de que o bem está vencendo o mal.

Por isso, tenho fé, acredito e me emociono com a chegada de mais um ser humano na terra. Por isso, te espero, meu querido, minha querida, meu amor.

Posso gritar hoje, parafraseando a cena daquele filme tão visto: I am the QUEEN of the world!

Sim. Tenho super poderes. Sou de novo, a menina serelepe, sapeca, inquieta, parecida com mandruvá em terra quente, cheia de expectativas e de desejos. Sou avó!

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