Estou prestes a completar 50 anos e, apesar de estar um
pouco assustada e amedrontada com o que virá, pois vivemos num mundo que ainda
não sabe tratar bem os idosos, tenho me permitido, já há algum tempo, me
maravilhar com as descobertas desta fase da vida.
As principais, que me estimulam muito, são a percepção de
que os problemas diminuem de tamanho, com o passar do tempo; e a constatação,
perplexa e com uma certa alegria, de que este não é um tempo só de perdas.
Que tranquilidade me dá quando me deparo com uma
dificuldade e não sinto mais tão fortemente aquele frio na espinha, e não passo
tantas noites em claro, e não perco imediatamente a paciência nem o humor e me
acalmo com a certeza de que, seja o que for, vai passar.
Neste semestre, perdi um parente querido e meu filho
sobreviveu a um acidente de carro terrível. Enfrentei estas situações, com as
marcas que elas nos deixam, é claro, mas com sabedoria e equilíbrio. Em paz.
É a temperança que chega,
devagarinho, se instalando em mim. Essa virtude - tão necessária neste momento
em que as relações são tão instantâneas, em que se valoriza o prazer imediato,
em que a ode da moda é a felicidade a todo custo, mesmo que seja à custa da
infelicidade de outros - é um presente do tempo.
Bom aceitar as rugas e os limites do corpo, cuidando dele,
mas sem o afã da beleza ilusória e a alto preço. Doeu ver as bolsas de gordura
e de pele se formarem sob minhas pálpebras e ainda dói ver meu corpo ganhar uma
forma estranha, não vou negar. Além disso, as letras diminuíram
consideravelmente de tamanho e a minha memória me trai quando mais preciso
dela. Mas tudo isso é já parte de mim, me constitui.
Bom ter mais tempo e mais espaço para ouvir os outros.
Este, mais um presente que a idade nos dá: ouvimos mais e melhor, ouvimos com o
corpo e com a alma.
No livro “Vidas a retalho”, apresentei, como uma das razões
pelas quais escrevo, a minha crença em que permaneceremos vivos, através da
escrita, de que nos perpetuaremos nos que virão, nas pessoas que já amamos,
mesmo sem conhecê-las, nas pessoas, mesmo, que nunca conheceremos: os filhos
dos filhos dos nosso filhos.
Era uma ideia, um desejo, uma fé.
Agora é verdade.
Vou ser avó. E a imagem que hipotetizei anos a fio e que
foi culturalmente construída em mim, em todas nós: a de uma mulher vencida pelo
cansaço das batalhas da vida, sem brilho, sem gás, sem projetos; e a imagem
estereotipada - coquinho na cabeça, grisalha, xale nas costas, tricô e cadeira
de balanço - simplesmente se foi, evaporou-se.
É exatamente o oposto.
Sou tomada por um sentimento de plenitude, de vida que se
renova, de recomeço. Amo mais e amo melhor.
Me vejo com este novo ser nos braços e me sinto eterna.
Nele, meu filho renasce e eu também.
Eu gosto de gente.
Não me engano. Sei que não há limites para a maldade
humana, mas também sei que não há limites para a bondade humana. E me alegro
com os exemplos que vejo, todos os dias, de que o bem está vencendo o mal.
Por isso, tenho fé, acredito e me emociono com a chegada de
mais um ser humano na terra. Por isso, te espero, meu querido, minha querida,
meu amor.
Posso gritar hoje, parafraseando a cena daquele filme tão
visto: I am the QUEEN of the world!
Sim. Tenho super poderes. Sou de novo, a menina serelepe,
sapeca, inquieta, parecida com mandruvá
em terra quente, cheia de expectativas e de desejos. Sou avó!
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