sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Palavras curadoras

     A vida se refaz. Deus, pai de extrema bondade, ou, se preferirmos, a entidade que nos governa, a luz, nossos tantos deuses ou como quer que os nomeemos, nos possibilitam recomeços, sempre.
     O problema é que, em momentos de caos, não dá pra acreditar nessa premissa. Não é possível nem mesmo imaginar que haverá uma única saída para nossos dramas, medos e dores.
     É como se estivéssemos no olho de um furacão, sendo levados, sem controle e sem domínio das nossas ações, das nossas reações e dos sentimentos, quase sempre conflituosos, contraditórios que nos comandam.
     Vivi dias de caos, Quem é que não os viveu.
     Lembro-me de uma manhã em que eu subia, a pé, a avenida Sete de Setembro, chorando de soluçar, com olhos tão enevoados que ficava difícil enxergar a calçada, a guia, a sarjeta e os transeuntes. Apenas lágrimas, passos trôpegos e um buraco na alma que me garantia a impossibilidade de prosseguir.
     Abandono, perda, amor em vão, uma sozinhez de dar dó.
     Era a hora de um milagre. Um daqueles nos quais acredito piamente, que acontecem todos os dias, mas que não os vemos, pois perdemos nossos olhos de ver essas dádivas.
     E aconteceu.
     Uma mulher que vinha na direção oposta, de repente, pára sua caminhada, me pega pelo braço, me segura, ao mesmo tempo, com delicadeza e determinação.
     Eu a vi, com certeza. Não sou capaz de descrevê-la. Depois de tantos anos, sua imagem se perdeu. Mas o seu gesto foi fundamental naquele momento.
     Ela me olhou nos olhos e me disse: “Minha filha, tenha fé, viu, tenha fé. Deus é um pai de extrema bondade. Vai passar. Vai passar!”.
     E se foi.
     O fato é que aquelas palavras foram ditas no momento certo e me calaram um pouco as dores e as mágoas.
     Os passos seguintes já foram mais leves.
     Sobrevivi à tormenta. Vieram outras. Tantas outras. Elas sempre vêm. Sobrevivi a todas. E de todas saí melhor.
      Ao longo da vida, sempre que encontrei uma aluna, uma amiga, uma irmã, atormentadas, com problemas, querendo abandonar um curso, o casamento, a vida, eu me lembrei dessa mulher e repeti suas poucas palavras, tentando causar um efeito idêntico ao que ela causou em mim.
      Palavras curadoras.
     E digo: “Vai passar, minha querida, vai passar, você vai ver, a cada dia você se sentirá melhor e melhor. Deus é um pai de extrema bondade e permite que a vida se refaça!”.
     Lembro-me desse episódio hoje e não é à toa essa lembrança. Estou saindo de mais uma tormenta. Como nas outras, também achei que não conseguiria, que não daria conta. E mais uma vez, me apoiei nessa desconhecida que me fez um bem enorme, sem saber que o fazia.
     Na verdade, acho que ela me disse muitas vezes aquela frase e desta vez, me disse de novo.
     E eu estou aqui, recomeçando, como fênix, renascendo das cinzas.
     Estranha mulher. Abençoada mulher. Benditas foram as suas palavras.
     Que a sua vida esteja sendo leve, firme, repleta de amorosidade como as palavras que você me disse naquela manhã tão distante, na subidinha da avenida sete de setembro. 
     Palavras abençoadas.
     De uma desconhecida.

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