quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Velhinhos na praia



   Há um texto do escritor Mário Quintana chamado Chapéu violeta. Eu o li no blog http://marioquintanavidaeobra.blogspot.com.br, mas há vários sites que o reproduzem.
   No texto, o autor reflete sobre a forma de nós, as mulheres, lidarmos com nosso corpo, com a beleza, enfim, denunciando que, quanto mais jovem, mais exigente consigo própria a mulher é e menos vê quem e como de fato ela é. A capacidade de se ver sem as pressões do entorno vem com a sabedoria trazida pelo tempo...
   Leiam: “3 anos: ela olha pra si mesma e vê uma rainha. Aos 8 anos: ela olha pra si e vê cinderela. Aos 15 anos: ela olha e vê uma freira horrorosa. Aos 20 anos: ela olha e se vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, decide sair mas... Vai sofrendo... Aos 30 : ela olha pra si mesma e vê muito gorda/ muito magra, muito alta/ muito baixa, muito liso/ muito encaracolado, mas decide que agora não tem tempo pra consertar então vai sair assim mesmo... . Aos 40 : ela se olha.... Vê muito gorda, muito magra, muito alta, muito baixa, muito liso, muito encaracolado, mas diz: pelo menos eu sou uma boa pessoa... E sai mesmo assim... Aos 50 anos: ela olha pra si mesma e se vê como é...sai e vai pra onde ela bem entender... . Aos 60 anos: ela se olha e lembra de todas as pessoas que não podem mais se olhar no espelho...sai de casa e conquista o mundo... Aos 70 anos: ela olha pra si e vê sabedoria, risos, habilidades, sai para o mundo e aproveita a vida... Aos 80 anos: ela não se incomoda mais em se olhar... Põe simplesmente um chapéu violeta e vai se divertir com o mundo... . Talvez devêssemos pôr aquele chapéu violeta mais cedo...”
   Conto-lhes isso porque tem a ver com a história de hoje.
   Estávamos em Camboriú, num tempo que vai relativamente longe. Eu havi comprado um biquini novo e a novidade é que a parte de cima era tomara que caia. Veja só, nunca tinha usado um biquini tomara que caia na vida, mas, já beirando os cinquenta, caí nessa roubada. Talvez porque quem estivesse comigo dissera que ficou bom – filha ou irmã, normalmente – ou talvez porque eu já estivesse perto da compreensão da mulher do chapeú violeta.
   O fato é que fui à praia e lá chegando, não tive coragem de usar a parte de cima do tomara que caia. Usei uma peça antiga, de alças. No fundo, no fundo, eu já sabia que não a usaria, senão, não teria levado um substituto.
   Logo nos primeiros dias, eu vi a cena que me ajudaria durante muito tempo a, na hora da dúvida, não apenas em relação às roupas, mas também em quaisquer circunstâncias, optar pela postura que eu considerasse a mais verdadeira.
   Vinha no sentido contrário, um casal de velhinhos, caminhando na areia, de mãos dadas.
   Seus corpos, marcados pelo inplacável do tempo, estampavam todas as marcas das experiências vividas. Rugas formando camadas que se sobrepunham umas às outras, como marcas deixadas na areia por ondas infindas, umas dobradinhas sobre as outras,formando um riscadinho que cobria todas as partes visíveis dos seus corpos.
   A postura do casal exalava uma altivez e uma dignidade ímpares, enquanto seus corpos   denunciavam, naquele ambiente de exibição de corpos sarados, a realidade da qual muitos tentam fugir. Olhando-os, senti vontade de envelhecer como eles – mas esta será uma outra história.
   A cena chamou-me a atenção mais que qualquer outra porque a mulher estava com um biquini tomara que caia. Seus seios, muito murchinhos – já ouvi os chamarem, quando estão neste estado, de muxibas – acomodavam-se muito próximo ao abdômen e lá o tomara que caia ajeitara-se, encontrando o seu lugar. Mas deixando cair, delicadamente.
   Era belo, simplesmente.
   Voltei me sentindo ridícula. Eu, com tantos pudores, e aquela “senhorinha” senhora de si, altiva, sabendo-se ser como era e aceitando-se.
   Não tive dúvidas. No dia seguinte, estava eu, na praia, com meu biquini tomara que caia.
   Mas fui só uma vez. Ficou claro que ainda não tinha aprendido a lição do Chapéu violeta, mas, a cada dia, me encaminho para a sua perfeita compreensão. Até porque é inevitável. Espero que aconteça, logo. Será uma libertação.
   Ainda vou escrever muito sobre velhice e sobre envelhecimento, já que estou em processo. O próximo texto será sobre os cabelos brancos.           

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